quinta-feira, 29 de setembro de 2011





Fique.
Enterrado à incontáveis palmos dentro da minha cabeça, onde só preciso lembrar pra ter-te perto. Fique. Nunca soube lidar com esses soluços e espasmos em que sempre voltava e me sentia em casa. Fique. Talvez eu simplesmente não aguente mais todo esse vazio que às vezes confundo com saudade. Fique. Destruindo tudo o que toca, me destruindo quando me toca.
Fique onde está, nas seis fotos coloridas que aparecerem fora de sequência, fique... enquanto eu as arranco em um bem-me-quer. Fique com medo pois não sabe o que faz. Fique nervoso pois não sabe onde está. Fique parado enquanto te deixo queimar, fique tranquilo enquanto fica pra trás.
No final das contas o relógio é lento demais.
Fica. Pode ficar, fique triste, fique feliz, fique arrependido, fique fugindo, fique indiferente, fique com medo, fique tentando, permaneça tentando. Fique quieto enquanto vai pra longe. Longe. Fique longe.

quinta-feira, 22 de setembro de 2011




Felicidade vem e vai. Os nós na minha cabeça oscilam de volume e enlouquecem, não falam tudo que têm a dizer... me enlouquecem. Não sei se é loucura, é meio louco. Às vezes tenho longos intervalos tediosos, e tédio é tão normal. Tanto faz se me importo ou deixo de me importar, se estou ou deixo de estar, tudo vai permanecer pela metade. Na metade do dia subo até a metade do prédio pra entrar na sala do meio e encontrar pessoas que se importam pela metade, estão meio aí, dispostas a percorrer meio caminho pra completar sua metade. Nunca fará sentido. Até que é meio irritante, mas basta meia pílula pra dormir, pupilas meio dilatadas, cobertor cobrindo meio corpo, um pouco de desespero, um pouco de epifania, meio cigarro, meio sonolenta, meio suicida, só pra desaparecer completamente.
Felicidade foi, mas parou no meio do caminho, só pra poder olhar pra trás.

quarta-feira, 21 de setembro de 2011




Faça das lâmpadas empoeiradas de minha aura a luz que ilumina os passos de teus ancestrais, os passos que almeja dar, e então, finalmente achará teu lar, mesmo que não seja onde tenha o deixado, ou continue a tentar desenrolar os finos fios de navalha que marcam tua face atrás das gotinhas salgadas que brotam sempre tão brilhantes. Continue a reclamar de todos os caminhos, todos os degraus, todos os cantos, fotografias, memórias, tristezas que merecem o toque da tua gélida respiração. Tente entender que cada segundo aqui enche teus pulmões de nada e sangra teu coração por tudo, não pertence a essa atmosfera ácida, não precisa voltar... Estarei aqui pra sempre, até o tempo desistir de mim. Apenas faça de mim um molde bruto de tua memória, me procure, estarei vagando pela cidade que nunca dorme quando estiver mais acordada que nunca, faça de mim o que tu é. Olhe em meus olhos e diga se vê minha alma, minha alma tão vazia quanto os meus olhos.





Meu amor, fale mais alto, estamos separados por um abismo vazio que ecoa as batidas do meu coração aflito, desesperado pelo timbre de tua voz.
Eu te suplico. Mesmo que não alcance minha mão, fale mais alto, grite e se deixe levar, me deixe te buscar, cante com tua voz desafinada e tua alma melodiosa, faça de mim alguém são.
Tentei gritar teu nome enquanto jogava uma linha na rachadura sem fim, para ver se eu conseguia pescar um sonho torturante feito de papel. Por mais que eu tentasse, não conseguia (...)
O anestésico estava borbulhante, os hematomas e contusões não me preocupam mais. O abismo já não é o maior problema de todos, é a emergência, a sua, a minha. Já ouço o som da pele morta no chão de madeira, já sinto o cheiro das asas de quarentena... Sente-se e relaxe, eu estou chegando.
Vou esperar a gravidade me levar até você. Só, por favor, fale mais alto para que eu possa ouvir algo além do vento, que me sussurra piadas extasiantes.
Me fez prometer que não te seguiria quando partisse, mas vimos como não sou confiável desde o primeiro minuto. Foi a promessa quebrada mais honrada de toda nossa história. Minhas alucinações vão partir e eu nunca mais terei o mesmo pesadelo, meu pior pesadelo, meu pesadelo favorito. Mas logo estarei aí, segurando o mundo com meu punho, esculpindo as estrelas com as unhas, assim como você o faz.
Agora vá acender seu cigarro, pois logo estarei com você.
Fale mais alto, pois apesar de eu não entender suas palavras, eu sei que é sua voz.

Faz Parte do Meu Show.




Sinto que dormi uma longa eternidade, mas o Sol não nasceu. A escuridão transpassa a janela manchada pelos meus dedos, meus olhos ainda pesam, não sinto falta da luz.
Corro ao redor do inferno apagado pelas goteiras do teto de vidro, tateando a saída entre a insanidade e a loucura, procurando um rosto angelical sem emoção, sem um nome para chamar, um rosto dono de uma alma desafinada e um coração melodioso, pulmões negros e uma silhueta nobre. Que tenha como reflexo um borrão translúcido, que não sinta falta do Sol que não nasce.
No olhar vazio daquele rosto angelical sinto a morfina dos dias negros, vertigem sufocante, corações partidos, sinto minha presença. Meia gota apertada no cantinho, levitando em teus sonhos que partem, escorrem pelo teu rosto angelical e se libertam do teu pescoço, acenando sobre o dia escuro. Tua auréola flutua sobre tua cabeça, ela reina sobre mim.
O Sol ameaçou nascer. O céu preto se torna azulado aos poucos, minhas mãos tremem. Quando a luz turva me permite olhar no relógio vejo que minha longa eternidade havia durado doze minutos. O rosto angelical não estava mais ao alcance do meu tato, nem dos meus olhos que agora explodem com toda aquela luz, era fruto da escuridão maciça que iludia minhas mãos. Meu hoje, na verdade era ontem e a louca insanidade não tem uma realidade alternativa, continua a mesma. Faz parte do meu show, meu amor.

Eu queria poder escrever detalhadamente todas as minhas lembranças de quando eu não vivia da minha vontade de morrer. Eu posso, mas não tenho coragem de dividir minha felicidade, já é tão pouca, tão pouca e tão minha. Eu só queria desfazer mais um girassol e encher seu cabelo de pétalas amareladas num final de tarde qualquer, em que seus olhos verdes ficam meio azulados, meio psicodélicos, suas mãos geladas começam a suar e minha respiração fica tão leve quanto a sua. Eu só queria te enterrar no fundo do meu coração e viver da sensação boa que sua lembrança me dá. Você tem todo meu perdão, toda minha saudade, tem todo o meu coração.

Uma gotinha salgada brota no cantinho dos seus olhos, sob sua pequena auréola, escorre pelo seu rosto e se liberta pelo seu pescoço. Acena em despedida sobre as ondas sonolentas cavalgando para trás do oceano vazio.
Seus sonhos se deterioram assim, como suas asas. Penas amareladas flutuam, perseguidas pelo vento assobiante nessa translúcida escuridão.
Meia gota salgada brota no cantinho novamente, mas desta vez não escorre, apenas brilha em teus olhos castanhos. Meia gota, gota inteira, nada muda. Apenas olhe o relógio, apague seu cigarro e tente voltar a dormir.

Eu vou parar de me espremer nos cantos da minha saudade, calar a minha boca e tentar continuar. Deixar evaporar os pingos de vida restante que escorriam dos meus olhos e tentar continuar. Eu vou tentar ser forte, superar e continuar. Eu vou parar de mentir e voltar a me espremer nos cantos da minha saudade, porque horas passam, a vida passa, a dor não passa.



Eu tenho cigarros e músicas tristes, uma gaveta com uma carta ou duas que eu escrevi pra você não ler, onde costumo te chamar de “meu amor” e de outros codinomes só pra fingir que é de verdade. Eu simplesmente apareço pra apontar todos os seus erros e pra fingir que te conheço, por mais difícil que seja. Eu te conheço tudo errado e não me importo.
Agora já é tarde pra tentar te ligar, e tudo que resta é esperar que a manhã te acorde, pra eu aparecer e te mostrar que está errado como sempre esteve, que tudo isso está errado, e que também me conhece errado, mas é o lado errado do medo que nos faz continuar.
Se eu quiser arrancar meus sapatos e dançar com o seu fantasma, me deixa, se o meu corpo vai, então foda-se minha alma… eu tenho cigarros e músicas tristes que sempre ficam toda vez que vai embora.

Esse é o som do fim misturado com alguns chiados loucos do começo, as sintonias se entrelaçam e se perdem. Junto se vai toda a minha paranóia e pode até ir meu par de asas de todas as vezes que me chamou de “anjo”. Tudo isso se dissolve aos poucos, simplesmente vai embora. Esvazia meu coração. Esvazia meu peito. Sorri meu rosto. Alegra meu dia. Já não importa o quanto você se importa.


Moscas. Um cigarro aqui, outro ali, paredes brancas manchadas de batom, lençóis com cheiro de despedida. Muito de mim, eu demais. Água fervendo, toalha molhada, embalagem de bom-bom, sorriso embaçado. Perfume. Meu Deus, perfume. Discos antigos, melodia conhecida, memórias antigas, inimigo conhecido. Cinzeiro, cinzas, cinzas, cinzas, garrafas, uma pena. Marca de mordida, marca de arranhão, marcas de digitais latejando pela pele. Pegadas que vão até a porta. Cafeína borbulhando na cocaína, inquietude, solitude, paranóia, leve toque de saudade.


A escuridão do quarto aumenta enquanto o gás do isqueiro vai acabando, eu não sei se a fumaça vem da minha cabeça ou do fogo que às vezes oscila. Eu tropeço em palavras mesmo que elas estejam em minha cabeça e sempre que tenho que começar tudo de novo, desmorono. Desmorono completamente quando você chora. Desmorono completamente quando eu não sei e eu simplesmente não sei. Eu não sei se são os três cobertores ou é simplesmente o peso de todas as vidas que não estou vivendo, só sei que ouço meus ossos se quebrarem aos poucos… mas não dura muito. O quarto todo foi dominado pela escuridão e pelo cheiro de gás, que trouxe consigo um chiado que me lembra de todas as vozes que um dia eu ignorei, ou pode ser só o som da chuva, me deixando desesperada pra conseguir dormir.